11.29.2011
9.05.2011
Para Schaeffer, a “imagem fotográfica é uma impressão química”¹, pois bem, pode ser que seja, mas se sim, amarramos a fotografia a um produto físico final que desdobra espacialmente um recorte espaço temporal dado no passado... eis a fotografia enquanto relíquia, da qual Barthez fala longamente.
Mas se... fotografia é escrita de luz, com luz, luz-escrita, não deveria ela estar presa a essa obrigatoriedade de eternizar um recorte da fluidez, da mobilidade²...
...Nenhuma escrita pressupõe a eternidade...
Alguém que escreve na areia da praia sabe que tal traço será levado pelo mar, e mesmo na imagem fotográfica, existe uma condição de tempo para a existência da película... o prazo de validade industrial.
Posso condicionar a fotografia à efemeridade. Fazendo do disparador a luz, eliminando o dispositivo fotográfico do processo da escritura... eis a fotografia fora do bidimensional, “aqui a fotografia invade o espaço.”³
Aqui é o Hacklab, 6 de agosto de 2011, onde se deu a primeira experimentação dessa escritura para o efêmero. Como membro do QualquerQuoletivo, fui convidado a fazer a iluminação do evento, e ai vem o desdobramento subseqüente.
Meu disparador é o ascender das lâmpadas, meu enquadramento, seus posicionamentos e a dinâmica da própria cena, em toda sua tridimensionalidade... a foto(luz) permanece enquanto o motivo tece permanentemente a grafia...
...o aparelho foi eliminado...
...foi eliminada a dependência sufocante da tecnologia, torna-se consciente uma fotografia invisível, a de todo momento, a que se desenrola sem ser captada. Sem o aparelho, o homem é obrigado a reconstruir o fazer, e ai, “a gambiarra vira força criativa”³.
Do lixo luz... não era exatamente esse o discurso mas assim foi pra mim a oficina Devoluções ocorrida no Casarão, se a idéia era transformar lixo em produtos, o fiz em equipamentos, criando os dois primeiros dispositivos de luz... holofotes do lixo, canos de esgoto, madeiras da rua e fios elétricos, esses da loja, compõe a estrutura... eis “a potência do subdesenvolvimento em desvirtualização” ³.
Man Ray, quando dadaísta, criou suas rayografias a partir de uma negação as técnicas estabelecidas historicamente... pois bem, não necessariamente contra história, mas sim contra a arte feita de cima para baixo da qual fala Barrio, elimino o aparelho, elimino o laboratório, o cordão umbilical tecnologico é cortado, a metodologia fica em aberto...
...fotografia não é registro!
1 – Schaeffer, Jean-Marie. Imagem Precária A. Papirus, 1996.
2 – “A verdade é que mudamos sem cessar e que o próprio estado já é a mudança”... ”uma fixidez não passa de um arranjo efêmero entre mobilidades” Bergson, Henri. Memória e Vida. Martins Fontes, 2006.
3 – Meu via Qualquer Quoletivo publicado em http://hacklab.comumlab.org/wikka.php?wakka=DiariodeBordoQQ em 06/08/2011
(anteontem)
+ sobre fotografia e efemeridade
Queria falar um pouco sobre o trabalho da artista visual Miwa, que chegou até mim esta semana, período gestativo das idéias acima descritas. A cerca da fotografia dentro do espaço-agora, que não desdobrasse o tempo mas participasse da construção do próprio estado presente, sem objetivar o registro, priorizando a fala...
...expressão poética para o agora.
Miwa se apresentou esse ano, 2011, na XX edição do Animamundi, claro, em São Paulo. Em Belém, pude ver o registro dessa apresentação em vídeo, disponibilizado por Maécio Monteiro, ao qual, sou muito grato por isso.
Miwa, em sua apresentação, estabelece interações corpo-videografica...
1) Miwa, se posiciona entre a luz do projetor, e a tela...
... a tela não está emulsionada.
Se estivesse, teríamos uma impressão transversal, como nos fotogramas diria Schaeffer, ou mesmo, uma impressão de traços do visível (por Dubois). Teriamos uma imagem fotográfica...
... o que tento afirmar nesse texto... é que temos fotografia em Miwa.
Todo o processo é análogo ao dos fotogramas. A luz escreve a obra...
2) Luz, tela e Miwa. O que caracterizaria uma sobreposição de imagens, neste caso feita a partir da sobra de luz que atravessa a tela branca para desenhar a silhueta do corpo.
Claro, é uma obra audiovisual, temos a trilha, elogiável, temos o movimento corporal da artista, e temos todos os componentes imagéticos-estéticos da projeção, possiveis a partir de variações de iluminação efetuadas pelo projetor, que é o aparelho, neste caso.
Miwa não fez um trabalho fotográfico.
Não reduzo o trabalho dela a isto.
Miwa fez um trabalho que é fotografia.
Fotografia não é a imagem fotográfica!
(ontem)
5.20.2011
Quem Matou? Quem Morreu? Quem Colou?
Em 69, Arthur Barrio, defendia em manifesto a utilização de materiais baratos em contraposição as produções do sistema de arte oficial, estabelecido a partir de interesses econômicos, logo, centralizado nos Estados Unidos e na Europa. Como Barrio, o cenário que me cerca, que cerco, que respiro, é o terceiro mundo, especificamente Belém do Pará, cidade a margem do processo da globalização, onde se convive com todos os problemas das grandes metrópoles sem usufruir de suas pseudo vantagens.
Qual a saída para uma arte que se pretende para o mundo, e não mais para o mercado, que tem como alvo não mais o público intelectualizado, mas o povo, o todo? Como criar um discurso com volume e impacto social quando os recursos necessários para uma emissão amplificada são escassos?
Como Barrio, Hélio, Glauber, dentre outros, (re)visito essas perguntas. Para a primeira, minha resposta é a rua. Para a segunda, a xerox.
Evoco o medo, essa patologia coletiva, que, seja pela violenta verdade ou pelo sensacionalismo dos meios de comunicação, se instalou e assombra a cidade. Coloco a violência da rua na rua, no horizonte da cidade, para que todos vejam aquilo que todos sentem. Retiro a fotografia do espaço hermético das galerias, da parede do burguês, e a coloco na textura da cidade, na parede dos transeuntes, chego ao povo e democratizo a experiência estética.
A Xerox é a caixa amplificada do discurso. Do auto-retrato digital, retalho a imagem em vinte folhas de a4, e alcanço dimensões reais dentro das possibilidades do bidimensional a um preço que não prejudica meu aluguel, assim, posso multiplicar meus pontos de inserção. A repetição do gesto (colagem) aumenta o volume da fala e a potência da obra.
É um homicídio. É uma contravenção. Um corpo iluminado assassinado em uma noite escura. O corpo é (m)eu. Que cola, que fala e se marginaliza a partir do falar. Quem sabe numa dessas madrugadas de colagens levo mesmo um tiro. Seria “o cumulo da metalinguagem”, o início e o fim da minha arte-vida.
para ver mais - http://www.flickr.com/photos/14486460@N06/sets/72157626612969259/
1.29.2011
... da série Contra Aparelho
Sem Titulo(s)
Técnica: Sobreposição em 35mm
Ano: 2010
A série “Contra Aparelho” se funda no entendimento do fotografar como um jogo entre fotografo e aparelho, no qual, o primeiro se esforça em esgotar o programa interno do segundo, ou seja, suas virtualidades, enquanto o segundo vai, a partir do uso do primeiro, compondo o que chamamos de universo fotográfico. ´
Cabe aqui, antes de nos aprofundarmos na questão, estabelecer as devidas diferenças entre instrumento e aparelho. Instrumentos são prolongações do corpo e sãs descobertos de maneira fundamentalmente empírica, aparelhos surgem a partir de teorias cientificas, o estar programado é que os caracteriza, e é nesse programa interno que se funda o jogo.
Aparelho aqui é o aparelho fotográfico, especificamente uma câmera analógica Zenit modelo DF-300 de fabricação soviética, provavelmente produzida na década de oitenta, portanto, as três fotografias aqui apresentadas se encontram originalmente em um rolo de negativo de 24 quadros de ISO 100. Ora, todos esses dados fazem parte do jogo, eles determinam movimentações, procedimentos e até regras se levarmos em consideração que tais dados impõem limites a produção, e são esses limites que neste trabalho tentam ser transgredidos.
Histórico do jogo:
A câmera foi ajustada como de práxis (logo o fotômetro me indicava qual a melhor velocidade para a abertura que estava utilizando); fotografei com a metade da velocidade indicada; passei o negativo na manivela a direita; fiz outra fotografia da mesma maneira; e outra; girei quatro ou cinco vezes a manivela a esquerda (assim, rebobinei o negativo); fotografei novamente; e de novo; e de novo...
Aí está, o processo em texto, o resultado em imagem.
Joguei contra. Fugi dos 24 quadros pré estabelecidos na programação, no lugar de uma imagem, tenho uma sobre a outra, em sobreposições que formam uma escala sem interrupções, não se trata de uma imagem final, e sim de uma imagem meio, possivelmente o mais próximo que se pode chegar do rizoma deleuziano em fotografia. Fujo dos 24 quadros e fujo da representação fechada.
Para Flusser, isso pode ser apenas mais um dos resultados possíveis do aparelho, mesmo se for, ainda assim estaríamos de frente com um signo de referentes múltiplos (para citar a semiótica), um signo indeterminado, uma imagem inominável. Sem titulo.
Três das fotografias acima participaram da XIX Mostra de Arte Primeiros Passos realizada pelo Centro Cultural Brasil Estados Unidos, CCBEU em dezembro de 2010
Para ver mais - www.flickr.com/photos/14486460@n06/